O Transtorno do Espectro da Neuromielite Óptica (NMOSD), apresenta maior incidência entre mulheres negras, conforme reafirma um estudo recente realizado com uma população multiétnica na Califórnia do Sul (EUA). A pesquisa, que analisou dados de 2010 a 2021, destacou a alta prevalência do diagnóstico em pessoas negras, especialmente mulheres, em comparação com outros grupos raciais. Esse fenômeno acende um alerta sobre as disparidades de saúde que afetam a população negra, tema também relevante no contexto brasileiro.
O estudo identificou que, entre os 127 pacientes diagnosticados com NMOSD, 86,6% eram mulheres, e a maioria delas, negras. A incidência entre pessoas negras foi de 9,21 casos por milhão de pessoas-ano, significativamente maior que em outros grupos étnicos, como asiáticos (3,77), hispânicos (2,02) e brancos (1,56). Esses dados chamam a atenção para um cenário de vulnerabilidade que reflete, em parte, as condições de saúde da população negra no Brasil, onde persistem lacunas históricas no acesso a cuidados médicos adequados e diagnóstico precoce.
Acesso à Saúde e Diagnóstico Tardio no Brasil
No Brasil, segundo o IBGE, cerca de 56% da população se autodeclara negra ou parda, e estudos têm mostrado que esse grupo tem menos acesso a serviços de saúde de qualidade, além de enfrentar taxas mais altas de doenças crônicas e menor expectativa de vida. Mulheres negras, especificamente, estão entre os grupos mais afetados pelas disparidades, incluindo diagnósticos tardios em condições neurológicas graves, como a NMOSD.
A pesquisa norte-americana reforça a importância do diagnóstico precoce, especialmente em uma doença com sintomas debilitantes, que incluem paralisia e perda de visão. No entanto, muitos pacientes negros brasileiros enfrentam desafios para obter um diagnóstico rápido, o que é crucial para a gestão de doenças autoimunes. Estudos de instituições como a Fiocruz mostram que as pessoas negras são menos propensas a receber exames preventivos e enfrentam dificuldades para acessar tratamentos especializados.
Fatores Sociais e Econômicos Aumentam Risco
No Brasil, as condições sociais e econômicas também contribuem para a maior vulnerabilidade da população negra em relação a doenças autoimunes e neurológicas. Desigualdades como renda mais baixa e maior exposição ao estresse crônico, associados à discriminação e ao racismo, aumentam os fatores de risco para condições de saúde complexas. Segundo a Sociedade Brasileira de Neurologia, essas desigualdades impactam diretamente no acesso a especialistas e na continuidade do tratamento, afetando especialmente mulheres negras.
A Importância da Pesquisa e do Investimento em Saúde Pública
A identificação de uma maior prevalência de NMOSD em mulheres negras aponta para a necessidade de mais estudos e investimentos em saúde pública no Brasil, voltados especificamente para a população negra. Especialistas defendem que pesquisas como a realizada na Califórnia poderiam inspirar iniciativas semelhantes no Brasil, com foco em compreender melhor as causas das disparidades e em promover políticas de saúde equitativas.
Além disso, organizações da área de saúde têm solicitado ao governo brasileiro a ampliação de campanhas de conscientização e de programas de capacitação para profissionais de saúde. O objetivo é fortalecer o diagnóstico precoce e garantir o acesso ao tratamento para doenças neurológicas autoimunes, com atenção especial às necessidades das mulheres negras.
A prevalência da NMOSD em mulheres negras, revelada no estudo norte-americano, enfatiza um problema mais amplo de desigualdade em saúde que afeta milhões de brasileiros. Políticas públicas efetivas que abordem as necessidades específicas desse grupo são fundamentais para reduzir as disparidades e melhorar a qualidade de vida de uma parcela significativa da população. Neste Dia da Consciência Negra, a reflexão e a ação em torno das desigualdades em saúde se tornam mais urgentes do que nunca, exigindo um compromisso renovado de toda a sociedade.
Referências:
- Política Nacional de Saúde Integral da População Negra Uma Política do SUS. Brasília, 2017. Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_populacao_negra_3d.pdf
- Angus Lee, Jessica Smith, Bonnie Li, Radostina Iordanova, and Annette Langer-Gould. Racial and Ethnic Disparities in the Incidence of Neuromyelitis Optica Spectrum Disorder (P4-4.002). Neurology. 2024. Disponível em https://www.neurology.org/doi/10.1212/WNL.0000000000206488